Porto, 18 Fev (Lusa) - O presidente da Conselho Nacional de Educação (CNE), Júlio Pedrosa, disse no Porto que, em Portugal, ainda não houve um entendimento "sobre os fins da educação e o que é educar".
Segundo Júlio Pedrosa, "é por isso é que às vezes há tantos conflitos entre quem está dentro da escola e quem é encarregado de educação".
O responsável, que foi ministro da Educação num dos governos de António Guterres, falou terça-feira à noite, no Porto, num debate sobre autonomia promovido pela Associação dos Estabelecimentos de Ensino Particular e Cooperativo.
Júlio Pedrosa considerou que "faz falta conversar" acerca dessa questão, situando-a no centro da discussão sobre o papel de cada uma das partes envolvidas na educação.
"Aquilo que neste momento me anda a interessar mais é o envolvimento familiar na escola, que é uma das questões mais prementes e vai ser cada mais aguda e crítica, à medida que a nossa sociedade se vai tornando mais complexa", acrescentou.
"Quando nós éramos crianças estava relativamente claro quais eram as responsabilidades da escola e da família e nessa altura cada um assumia essas responsabilidade", à luz do que era então a sociedade, afirmou o também antigo reitor da Universidade de Aveiro.
Júlio Pedrosa centrou a sua intervenção inicial em torno de três perguntas: "O que é a autonomia da escola?", "O que a justifica?" e "Para que deve servir?".
"Não vão ter aqui as respostas, vão ter apenas alguns contributos", advertiu Júlio Pedrosa, adiantando que para tal recorreu a um trabalho do professor João Formosinho, especialista em política educativa, e a um estudo realizado em 30 países europeus.
O presidente do CNE citou também uma investigadora norte-americana, da Universidade John Hopkins, que estabeleceu uma "distinção entre a escola como comunidade de profissionais e como comunidade de aprendizagem".
Em Portugal, referiu, o segundo conceito vigora desde 2007.
"São as famílias, as autarquias e outros actores relevantes locais a decidirem qual é a estratégia da escola, isto é, a serem donos da escola", indicou.
"Isto é uma mudança profundíssima", entende Júlio Pedrosa, indicando que a mesma investigadora defende que essa filosofia permite melhorar a escola, fortalecer as famílias, dar vigor ao apoio da comunidade e melhorar os resultados e o sucesso dos alunos.
No debate que se seguiu, o presidente da Associação dos Estabelecimentos de Ensino Particular e Cooperativo, João Alvarenga, perguntou se a autonomia escolar é "uma reacção contra a burocracia" e representa "mais eficiência e mais possibilidade de inovação"
"Mais eficiência se a escola tiver condições, liderança e organização para tirar partido dessa condição", respondeu Júlio Pedrosa, advertindo que mais autonomia implica também "maior responsabilidade".
No serviço público "temos obrigação de tirar o máximo partido dos recursos que ali estão, tanto mais quanto é certo que não temos ali, ao pé de nós, os donos desses recursos", argumentou o ex-ministro.
O problema é que "nós não cultivamos o valor da confiança mútua e temos necessidade, vezes de mais, de criar instrumentos de controlo".
Um dos presentes neste debate, na sua esmagadora maioria responsáveis por escolas privadas, quis saber se "a autonomia pode ser conquistada ou deve ser dada por decreto".
"Para eu ser autónomo tenho que ser capaz de mobilizar recursos para o ser", sustentou Júlio Pedrosa, acrescentando que "que tem mais capacidade de gerar recursos quem assumir maior autonomia".
"Eu sou um enorme defensor da nossa capacidade de sermos cidadãos plenos deste país", reforçou a mesma fonte, dizendo ainda que "há muito espaços para alargarmos as fronteiras do nosso espaço de acção".
As escolas particulares querem mais do que a "mera capacidade" para emitir certificados e diplomas, porque, segundo o vice-presidente da AEEP, "o essencial é a autonomia de projecto", que aliás é o tema do Congresso do sector marcado para Maio, em Lisboa.
"Porque é que há tanta resistência?", nomeadamente quando está em causa o ensino particular e cooperativo, questionou José Ferreira, reclamando "mecanismos mais simples e automáticos do reconhecimento da autonomia".
"Nós gerimos a nossa autonomia frequentemente não questionado a administração sequer, porque sabemos que se questionarmos a resposta é negativa", assumiu o mesmo dirigente associativo.
Na resposta, Júlio Pedrosa disse que Portugal precisa de trabalhar para que a "confiança mútua seja um valor sólido", considerando que ainda não existe uma administração pública com "regras de jogo claras, transparentes, de uso universal e de estímulo à responsabilização".
"Há realmente coisas que são inaceitáveis do ponto de vista da limitação à autonomia, para usar uma palavra suave. Temos de trazer a responsabilidade da educação para mais próximo da escola", completou o antigo governante.
João Trigo, da direcção nacional da AEEP e director do Colégio de Nossa Senhora do Rosário, no Porto, considerou que, em Portugal, existe "uma grande ditadura das leis" e que cada escola deve "correr riscos" na defesa dos seus interesses.
O responsável declarou-se defensor do "princípio de não perguntar nada" à tutela, tendo dado como exemplo a opção por tempos escolares organizados em "blocos de 70 minutos" no ensino básico, em vez dos 90 minutos fixados por lei.
"Estou inclinado a acreditar que não haverá nenhum alto responsável pela educação neste país que não deseja que a escola privada ou pública sirva o interesse público", afirmou Júlio Pedrosa.
A AEEP afirma representar em Portugal "cerca de 20 por cento de todo o ensino não estatal, com 320 mil alunos e 25 mil docentes, do pré-escolar ao secundário".
O debate com Júlio Pedrosa foi o primeiro de um ciclo de quatro que a associação agendou, a pretexto do seu congresso. Os próximos com Guilherme de Oliveira Martins (18 de Março, Lisboa), Maria do Ceú Roldão (21 de Abril, Porto) e Fernando Adão da Fonseca (Maio, Porto).
AYM.
© 2009 LUSA - Agência de Notícias de Portugal, S.A.2009-02-18 05:20:01
Segundo Júlio Pedrosa, "é por isso é que às vezes há tantos conflitos entre quem está dentro da escola e quem é encarregado de educação".
O responsável, que foi ministro da Educação num dos governos de António Guterres, falou terça-feira à noite, no Porto, num debate sobre autonomia promovido pela Associação dos Estabelecimentos de Ensino Particular e Cooperativo.
Júlio Pedrosa considerou que "faz falta conversar" acerca dessa questão, situando-a no centro da discussão sobre o papel de cada uma das partes envolvidas na educação.
"Aquilo que neste momento me anda a interessar mais é o envolvimento familiar na escola, que é uma das questões mais prementes e vai ser cada mais aguda e crítica, à medida que a nossa sociedade se vai tornando mais complexa", acrescentou.
"Quando nós éramos crianças estava relativamente claro quais eram as responsabilidades da escola e da família e nessa altura cada um assumia essas responsabilidade", à luz do que era então a sociedade, afirmou o também antigo reitor da Universidade de Aveiro.
Júlio Pedrosa centrou a sua intervenção inicial em torno de três perguntas: "O que é a autonomia da escola?", "O que a justifica?" e "Para que deve servir?".
"Não vão ter aqui as respostas, vão ter apenas alguns contributos", advertiu Júlio Pedrosa, adiantando que para tal recorreu a um trabalho do professor João Formosinho, especialista em política educativa, e a um estudo realizado em 30 países europeus.
O presidente do CNE citou também uma investigadora norte-americana, da Universidade John Hopkins, que estabeleceu uma "distinção entre a escola como comunidade de profissionais e como comunidade de aprendizagem".
Em Portugal, referiu, o segundo conceito vigora desde 2007.
"São as famílias, as autarquias e outros actores relevantes locais a decidirem qual é a estratégia da escola, isto é, a serem donos da escola", indicou.
"Isto é uma mudança profundíssima", entende Júlio Pedrosa, indicando que a mesma investigadora defende que essa filosofia permite melhorar a escola, fortalecer as famílias, dar vigor ao apoio da comunidade e melhorar os resultados e o sucesso dos alunos.
No debate que se seguiu, o presidente da Associação dos Estabelecimentos de Ensino Particular e Cooperativo, João Alvarenga, perguntou se a autonomia escolar é "uma reacção contra a burocracia" e representa "mais eficiência e mais possibilidade de inovação"
"Mais eficiência se a escola tiver condições, liderança e organização para tirar partido dessa condição", respondeu Júlio Pedrosa, advertindo que mais autonomia implica também "maior responsabilidade".
No serviço público "temos obrigação de tirar o máximo partido dos recursos que ali estão, tanto mais quanto é certo que não temos ali, ao pé de nós, os donos desses recursos", argumentou o ex-ministro.
O problema é que "nós não cultivamos o valor da confiança mútua e temos necessidade, vezes de mais, de criar instrumentos de controlo".
Um dos presentes neste debate, na sua esmagadora maioria responsáveis por escolas privadas, quis saber se "a autonomia pode ser conquistada ou deve ser dada por decreto".
"Para eu ser autónomo tenho que ser capaz de mobilizar recursos para o ser", sustentou Júlio Pedrosa, acrescentando que "que tem mais capacidade de gerar recursos quem assumir maior autonomia".
"Eu sou um enorme defensor da nossa capacidade de sermos cidadãos plenos deste país", reforçou a mesma fonte, dizendo ainda que "há muito espaços para alargarmos as fronteiras do nosso espaço de acção".
As escolas particulares querem mais do que a "mera capacidade" para emitir certificados e diplomas, porque, segundo o vice-presidente da AEEP, "o essencial é a autonomia de projecto", que aliás é o tema do Congresso do sector marcado para Maio, em Lisboa.
"Porque é que há tanta resistência?", nomeadamente quando está em causa o ensino particular e cooperativo, questionou José Ferreira, reclamando "mecanismos mais simples e automáticos do reconhecimento da autonomia".
"Nós gerimos a nossa autonomia frequentemente não questionado a administração sequer, porque sabemos que se questionarmos a resposta é negativa", assumiu o mesmo dirigente associativo.
Na resposta, Júlio Pedrosa disse que Portugal precisa de trabalhar para que a "confiança mútua seja um valor sólido", considerando que ainda não existe uma administração pública com "regras de jogo claras, transparentes, de uso universal e de estímulo à responsabilização".
"Há realmente coisas que são inaceitáveis do ponto de vista da limitação à autonomia, para usar uma palavra suave. Temos de trazer a responsabilidade da educação para mais próximo da escola", completou o antigo governante.
João Trigo, da direcção nacional da AEEP e director do Colégio de Nossa Senhora do Rosário, no Porto, considerou que, em Portugal, existe "uma grande ditadura das leis" e que cada escola deve "correr riscos" na defesa dos seus interesses.
O responsável declarou-se defensor do "princípio de não perguntar nada" à tutela, tendo dado como exemplo a opção por tempos escolares organizados em "blocos de 70 minutos" no ensino básico, em vez dos 90 minutos fixados por lei.
"Estou inclinado a acreditar que não haverá nenhum alto responsável pela educação neste país que não deseja que a escola privada ou pública sirva o interesse público", afirmou Júlio Pedrosa.
A AEEP afirma representar em Portugal "cerca de 20 por cento de todo o ensino não estatal, com 320 mil alunos e 25 mil docentes, do pré-escolar ao secundário".
O debate com Júlio Pedrosa foi o primeiro de um ciclo de quatro que a associação agendou, a pretexto do seu congresso. Os próximos com Guilherme de Oliveira Martins (18 de Março, Lisboa), Maria do Ceú Roldão (21 de Abril, Porto) e Fernando Adão da Fonseca (Maio, Porto).
AYM.
© 2009 LUSA - Agência de Notícias de Portugal, S.A.2009-02-18 05:20:01
Sem comentários:
Enviar um comentário